De uma forma muito coerente e bem fundamentada, a arquiteta Ana Paula Baltazar mostra que os conceitos "digital" e "virtual" são distintos, apesar da possibilidade de se estabelecer uma relação entre eles.
A relevância cada vez maior na arquitetura alcançada pelas tecnologias digitais é, segundo a autora do texto, notória desde os anos 60. Ela ressalva ainda que nos anos 80 o uso do computador como ferramenta de desenho é popularizado nos escritórios de arquitetura e mostra que as representações digitais são erroneamente denominadas projeto ou arquitetura virtuais.
Segundo Pierre Lévy existem duas ordens para as coisas: uma das substâncias e uma do evento. A substância representa o potencial e o real, ao passo que o evento ilustra muito bem o virtual e o atual. Ambas as ordens, entretanto, estão presentes na obra e, sobretudo, na arquitetura.
Ana Paula evidencia ainda que o grande problema é o uso da arquitetura para projetar apenas a substância e não o evento, embora essa representação seja referenciada no evento. O projeto arquitetônico, assim, restringe os usos previstos e deixa de lidar com o virtual, perdendo de vista que toda a virtualidade a ser atualizada é intrínseca aos próprios objetos e espaços. Dessa maneira, a autora anuncia que substância e evento são continuidades intrínsecas às coisas, não sendo, nem de longe, excludentes.
A possibilidade da criação de espaços-eventos, pensados como processo aberto, o qual estabelece uma continuidade entre projeto e uso, é defendida pela pesquisadora da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais.
Ana Paula Baltazar acredita que o capacete (helmetset) de Ivan Sutherland, chamado de "realidade virtual" na terminologia computacional, simula a realidade em sistemas imersivos ao reproduzir aspectos isolados do mundo físico no mundo digital. Para ela, nesse caso, os espectadores experienciam uma reprodução. Assim, é possível perceber quei o foco desse sestema volta-se para a substância e não para o evento.
Por outro lado, a doutoranda na Bartlett School of Architecture em Londres pensa que Lygia Clark, em sua obra "Máscara com Espelhos¨ (1967), apresenta um sistema aberto que só se completa temporariamente quando da experiência do espectador, enquadrando-se , assim, no modelo de seqüência ao estabelecer continuidade entre a obra e sua fruição e, ainda, mostra que na obra de Clark estão implícitos a dissolução dos limites entre sujeito e objeto e a busca dodesaparecimento do autor, o que é fundamental para a virtualização do processo. Os espectadores nesse outro sistema assumem a posição de partes vivas necessárias para completar a obra temporariamete, dando seqüência a ela.
Ana Paula dos Santos pensa que o Familistério de Godin, na França do século 19, pode ser entendido como um precursor da arquitetura virtual, pois, segundo Foucault ele deve ser considerado um projeto que alcançou a liberdade garantida pela própria liberdade, baseada no evento, em vez de repetir a experiência fracassada de tentar propor uma liberdade na estrutura das coisas baseada apenas na substância.
Ela expõe ainda que a arquitetura do Familistério proporciona os meios necessários para uma nova abordagem social da vida, garantindo o bem estar dos trabalhadores, sem limitar formal e materialmente os eventos que garantiriam tal bem estar.
Dessa maneira, apesar de a autora do texto comprova que uma arquitetura realmente virtual não é necessariamente digital.
Ela defende também a possibilidade do pensar uma arquitetura que seja realmente virtual, aproveitando-se o que de bom o digital tem a oferecer, em vez de simplesmente aceitar as tecnologias digitais na arquitetura sem qualquer questionamento.
Contudo, Ana Paula concorda que o digital facilita a arquitetura virtual por permitir a flexibilidade, a lógica de rede, a integração e abertura do sistema, a emergência do ambiente em tempo real, além do estabelicimento de continuitdade entre projeto e uso.
O Fresh Water Pavilion, do escritório NOX, na Holanda, e a Tenda Digital desenvolvida no Lagear da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais são exemplos citados pela pesquisadora que se apropriam da problematização da interação entre usuários e espaços físico e digital para apontar a possibilidade de um trabalho conjunto de digital e virtual.
Finalmente, Ana Paula Baltazar vislumbra o digital ora como uma ferramenta ora como ambiente ideal para o desenvolvimento da arquitetura virtual.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário